Envelhecimento de cervejas Orval
O primeiro evento memorável que pude participar foi, como denominaram os organizadores do BLES (grupo de entusiastas e apreciadores de cerveja dentro de outra grande associação chamada Zythos, na cidade de Zottegem): a "Orval Evening". Basicamente o objetivo do evento foi degustar as cervejas trapistas da Orval com diferentes períodos de guarda. O evento foi nas dependências de uma igreja (!) chamada Congregatiekapel, junto com alguns pães, embutidos e queijos também feitos pela Abbaye d'Orval.O primeiro evento memorável que pude participar foi, como denominaram os organizadores do BLES (grupo de entusiastas e apreciadores de cerveja dentro de outra grande associação chamada Zythos, na cidade de Zottegem): a "Orval Evening". Basicamente o objetivo do evento foi degustar as cervejas trapistas da Orval com diferentes períodos de guarda. O evento foi nas dependências de uma igreja (!) chamada Congregatiekapel, junto com alguns pães, embutidos e queijos também feitos pela Abbaye d'Orval.
Após pequenas apresentações sobre a cervejaria trapista, a primeira cerveja oferecida foi a chamada Orval Green - um privilégio dos participantes do evento pois se tratava de uma "table beer" (3,5%ABV) não comercializada, a "cerveja da casa", a ser apreciada pelos monges principalmente durante as refeições.
Em seguida foram servidas diferentes amostras da cerveja Orval, com seis diferentes tempos pós-envase*: 1 mês; 7 meses; 1,5 anos; 2,5 anos; 3,5 anos e 4,5 anos.
*Vale ressaltar que a cervejaria possui um hábito não tão comum de registro da data de envase, não do período de validade do produto - algo que poderia ser adotado por mais cervejarias no intuito de podermos controlar melhor o tempo de envelhecimento destas cervejas.
Não existe uma predição de como uma cerveja ale ou lager irá envelhecer pois isso depende de um sem-números de fatores: tempo/condições de envelhecimento, cor e composição geral da cerveja, presença de melanoidinas, oxigênio dissolvido, presença ou não de leveduras, cor da garrafa etc. Uma regra um tanto quanto aceita para ales é que características frutadas dos ésteres formados durante a fermentação bem como as notas herbais e florais dos lúpulos tendem a atenuar com o tempo (tanto em aroma quanto em amargor, em virtude da degradação destas moléculas). Já os aromas e sabores maltados e aqueles relativos ao envelhecimento, principalmente certos aldeídos e éteres formados (facilitado pelo etanol) como o 2-furfuryl ethyl ether (FEE), aumentam quase linearmente e conferem a sensação similar a solventes nestas cervejas.
O resultado desta degustação não fugiu do que a ciência previu. A amostra mais fresca, de um mês pós envase, era surpreendentemente floral e de alto amargor. (!) Ainda por lá tive a surpresa em saber que nesta tradicionalíssima cervejaria andam usando lúpulos americanos (!) E é uma pena que no Brasil seja impossível de se beber cervejas trapistas tão recentemente retiradas da cervejaria (que passam a vender suas cervejas em média 3 meses pós-envase). Então, saibam que a Orval jovem é um tanto quanto amarga e floral em seus primeiros estágios.
Seguidamente a amostra com 7 meses de envelhecimento foi a que mais apresentou características de fermentação por Brettanomyces(caráter ligeiramente floral e ácido, com caracterís
ticas delicadas de manga e abacaxi e, algumas vezes couro) e a terceira, com 1 ano e meio de guarda pareceu a mais equilibrada uma vez que as demais seguintes começaram a apresentar sinais negativos do envelhecimento embora aparecessem também outros caráteres favoráveis como o de "amêndoa", o benzaldeído quisto em cervejas escuras e de guarda.
Por fim, concluo este post com um estímulo para perdermos o medo de deixar nossas cervejas envelhecerem e jamais usarmos regras gerais, normalmente vindas do estudo de envelhecimento de lagers leves como pilsen que, definitivamente tendem a degradar excessivamente se postas aos paladares exigentes depois de um ano e meio de guarda.
